segunda-feira, 30 de julho de 2012

Minha melhor amiga de infância está grávida

A gente se conheceu na 6a série.
Eu estudei a minha vida inteira no mesmo colégio, e na 6a série meus pais decidiram que meu irmão e eu precisávamos de uma mudança.
O colégio novo era no mesmo bairro do colégio velho (que era o mesmo bairro da minha casa e do restaurante dos meus pais), mas era bem menor, e, pra quem estudou dos 3 aos 11 anos no mesmo lugar, bem diferente.
Meu irmão e eu chegamos cedo no primeiro dia de aula, bem coisa de primeiro dia de aula mesmo, porque no resto do ano a gente sempre chegava atrasado, e, enquanto esperávamos o portão abrir, ela  e uma outra garota vieram falar comigo.
Ela me perguntou em qual série eu estava, eu disse 6a, ela disse eu também.
Foi isso.
Depois, eu descobri que era a segunda vez que ela estava fazendo a 6a série, e garota que estava com ela na frente do portão era da 7a.

Eu odiava o colégio novo. Odiava o prédio, que era bem menor que o do colégio velho, odiava os professores, odiava os alunos, odiava tudo. Eu pensava o tempo inteiro em voltar pro colégio velho, nos amigos que ainda estudavam lá, nos professores, nos corredores, nas quadras, na aula de teatro.
O colégio novo também me odiava. Ele ficava no topo de uma ladeira enorme, que durava duas quadras, e o uniforme era azul, de um tecido muito leve, e eu tinha que usar uma calça embaixo do uniforme quando estava frio. Os professores não me tratavam mal, com exceção da professora de português, mas ela me tratava do jeito que eu tratava ela. Pensando agora, talvez não seja a atitude mais madura de uma mulher adulta ao lidar com garotas de 11 anos, mas como tratar garotas mal criadas e emburradas e respondonas de 11 anos? Os outros professores mal notavam a minha presença. A diretora do colégio me perguntou o que eu queria que ela fizesse quando eu contei pra ela que tinham sumido 10 reais da minha mochila. Numa aula de história, o professor me chamou pra buscar a minha prova, e eu estava tão distraída que não ouvi. Alguém teve que me cutucar pra eu levantar e buscar a prova. Eu peguei o papel, vi o 0 escrito em letra vermelha, e o professor quis conversar comigo. Quando eu voltei pra minha mesa, um dos alunos tinha escrito BURRA na minha carteira.
Até hoje eu não sei quem foi.

Eu quase repeti a 6a série. Todas as minhas notas eram horríveis, e, no final do ano, eu ainda insistia pros meus pais pra me colocarem no colégio antigo.
Eles não colocaram.

A 7a série não foi tão ruim.

A 8a série foi a melhor de todas.
A professora de português que me odiava virou a melhor professora de todas. Ela sempre passava temas bacanas de redação, e revisava com mais afinco o trabalho dos alunos que ela sabia que gostavam de escrever, tipo eu. Os alunos tinham se tornado amigos. Ela tinha se tornada uma das melhores, junto com outras duas.

Na quarta feira, eu e essas outras duas fomos na casa que ela divide com o namorado comemorar a notícia da gravidez. Ela mostrou pra gente um vídeo que mostra todos os períodos da gestação. Agora, o bebê dela é do tamanho de um gergilim. O apelido dele é Gergilinhe.

Doze anos atrás, quando eu estava com medo e com raiva da escola nova, ela foi a primeira pessoa a vir falar comigo. Demorou dois anos pra virarmos amigas. E somos amigas até hoje. Já fizemos tanta coisa juntas, e separadas, e depois contamos uma para outra. Porque a vida muda. Não nos vemos mais todos os dias, como no colégio, nem todo final de semana, como na faculdade. As vezes, ficamos meses sem nos ver. Mas crescemos juntas, e descobrimos coisas juntas. E agora vamos descobrir mais essa. A primeira de nós a casar foi ela, e a primeira a ficar grávida foi ela também. Bem como a gente tinha previsto dez anos antes.

Ela existe, e eu existo, e, apesar de não existirmos juntas, tudo que eu faço tem um pouco dela, e tudo que ela faz tem um pouco de mim.
Agora eu carrego o Gergilinhe pra todos os lugares.

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